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Deportação e Multa por excesso de estadia no Brasil: Entenda os riscos, as soluções e como se proteger.

1. Por que falar de excesso de estadia e deportação?

Quando o assunto é imigração, um dos maiores medos de quem vive ou visita o Brasil é ouvir as palavras “multa” e “deportação”. Esse receio é compreensível, mas, com informação correta, é possível:

  • evitar problemas antes que eles aconteçam;
  • reduzir danos se a situação já está irregular;
  • planejar um retorno seguro ao Brasil no futuro.

A Lei de Migração (Lei nº 13.445/2017) substituiu o antigo Estatuto do Estrangeiro e trouxe uma visão mais humanizada, reconhecendo a pessoa migrante como sujeito de direitos, e não como ameaça.

Desde logo, é importante esclarecer: situação migratória irregular não é crime no Brasil, e a legislação afasta a ideia de prisão apenas por motivos migratórios.


2. O que é “excesso de estadia” no Brasil?

De forma simples, há excesso de estadia quando o migrante permanece no Brasil por mais tempo do que o permitido no seu visto ou na sua autorização de residência.

2.1. Exemplos mais comuns

  • Visto de visita (turista):
    O Decreto nº 9.199/2017, que regulamenta a Lei de Migração, prevê que o visto de visita, em regra, permite até 90 dias de estada, prorrogáveis pela Polícia Federal por mais 90 dias, limitando-se a 180 dias por ano migratório.
  • Vistos temporários e autorizações de residência:
    Em vistos de trabalho, estudo, reunião familiar, acolhida humanitária, nômade digital e outros, o prazo de permanência é definido no próprio visto ou na autorização de residência.

Assim, há excesso de estadia quando, por exemplo:

  • a pessoa entra como turista, não pede prorrogação e continua no país após o término do prazo;
  • o visto de trabalho ou estudo vence e não é renovado;
  • a autorização de residência expira e o migrante não regulariza a situação.

3. Base legal da multa e da deportação

A Lei de Migração estabelece, no artigo 109, que permanecer em território nacional depois de esgotado o prazo legal da documentação migratória é infração administrativa. A sanção prevista é:

  • multa por dia de excesso e
  • deportação, se a pessoa não sair do país ou não regularizar a situação migratória no prazo fixado pela autoridade.

O Decreto nº 9.199/2017 detalha o procedimento, definindo:

  • como a Polícia Federal autua a infração;
  • como se calcula e cobra a multa;
  • como se instaura o processo de deportação e como a pessoa migrante exerce seu direito de defesa.

Em outras palavras: multa e deportação caminham juntas na legislação, mas nem sempre o caso termina em deportação. Há caminhos para regularizar ou ao menos reduzir o impacto.


4. Como funciona a multa por excesso de permanência

4.1. Valor da multa

De acordo com materiais oficiais elaborados pela Defensoria Pública da União e pela Organização Internacional para as Migrações (OIM), com base na Lei de Migração, a multa para pessoa física tem valor mínimo de R$ 100,00 e máximo de R$ 10.000,00.

O valor exato depende:

  • da quantidade de dias em situação irregular;
  • da regulamentação infralegal (decretos e portarias);
  • da análise do caso pela Polícia Federal.

Por isso, é fundamental consultar a unidade da PF ou um advogado especializado para saber quanto efetivamente será cobrado no seu caso.

4.2. Quando a multa é aplicada

Conforme orientações oficiais do Governo Federal, se a pessoa perde o prazo de estada como visitante (por exemplo, turista), ela será multada e notificada a se regularizar ou deixar o país em até 60 dias. A multa é calculada no momento do atendimento junto à PF.

Esse mesmo raciocínio se aplica, por analogia, a outros status migratórios: a irregularidade gera auto de infração, multa e prazo para regularização ou saída voluntária.

4.3. Prescrição da multa

A legislação prevê que a multa decorrente de infração migratória prescreve em 5 anos, contados da data da prática do ato (ou seja, do excesso de estadia).

4.4. Como é feito o pagamento (GRU e Receita Federal)

O pagamento da multa é feito por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), normalmente gerada no sistema da Polícia Federal. Essa guia é uma forma de arrecadação federal utilizada em diversos órgãos da União e envolve o sistema de receitas administrado pelo Tesouro Nacional/Receita Federal.

Em geral:

  • a PF emite a GRU correspondente à multa;
  • o pagamento pode ser feito em banco ou, em certos casos, por transferência do exterior, seguindo instruções específicas da PF (inclusive com envio de comprovante para e-mail institucional, como o canal de receitas da Polícia Federal).

5. A multa impede a pessoa de voltar ao Brasil?

Um ponto sensível: pagar a multa não apaga automaticamente todos os efeitos migratórios.

O Decreto nº 9.199/2017 deixa claro que, mesmo com o pagamento, pode continuar existindo impedimento de reingresso se a pessoa excedeu o prazo máximo de estada no ano migratório ou se houve deportação formal.

Em termos práticos:

  • quem apenas ultrapassou o prazo, pagou a multa e saiu voluntariamente, sem processo de deportação, em muitos casos poderá voltar, respeitando o regime de vistos e eventuais anotações no sistema;
  • quem foi deportado pode ter impedimento de retorno por determinado período, a depender da decisão administrativa.

Por isso, antes de planejar nova viagem ao Brasil, é prudente consultar:

  • um advogado especialista em imigração;
  • a própria repartição consular brasileira;
  • ou a Polícia Federal, quando já estiver no país de origem.

6. Deportação: quando o excesso de estadia vira processo administrativo

A deportação não é automática. Segundo a própria Polícia Federal, após a constatação da permanência irregular:

  1. A pessoa é notificada, com aplicação da multa e
  2. é dado um prazo de 60 dias para que deixe o país voluntariamente ou regularize sua situação migratória;
  3. se a pessoa não cumpre essa obrigação, pode ser instaurado processo administrativo de deportação, com direito de defesa e recurso.

Ainda assim:

  • não há prisão por mera irregularidade migratória;
  • o processo deve observar o contraditório e a ampla defesa, princípios reforçados pela própria Lei de Migração.

7. Possíveis soluções para quem já está em situação irregular

Se o prazo já expirou, nem tudo está perdido. Existem caminhos jurídicos que podem ser avaliados, caso a caso.

7.1. Regularização migratória (autorização de residência)

A Lei de Migração prevê diversas hipóteses de autorização de residência, como:

  • reunião familiar;
  • trabalho;
  • estudo;
  • acolhida humanitária;
  • atividade remota (nômade digital);
  • razões de política migratória ou casos especiais.

Muitas vezes, mesmo com excesso de estadia, é possível transformar a situação irregular em residência regular, desde que a pessoa se enquadre em algum fundamento legal.

7.2. Saída voluntária dentro do prazo

Recebida a notificação, respeitar o prazo de 60 dias para sair do país pode evitar:

  • a conclusão de um processo de deportação;
  • um histórico mais grave no sistema migratório.

Nesse cenário, a multa pode continuar devida, mas a pessoa reduz o risco de medidas mais severas e melhora as chances de voltar ao Brasil no futuro.

7.3. Defesa administrativa contra a multa ou contra a deportação

O Decreto nº 9.199/2017 prevê pedido de reconsideração e recurso das penalidades aplicadas, inclusive da multa e da decisão de deportação.

É possível discutir, por exemplo:

  • erro no cálculo de dias de excesso;
  • aplicação equivocada da norma;
  • circunstâncias excepcionais (doença grave, impedimentos de viagem, fechamento de fronteiras etc.);
  • pedido de redução ou isenção, em casos de hipossuficiência.

7.4. Isenção ou redução da multa por hipossuficiência econômica

A própria Lei de Migração e o Decreto nº 9.199/2017 preveem isenção de taxas e multas para pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Essa diretriz foi detalhada pela Portaria MJSP nº 218/2018 e por atos da Polícia Federal, incluindo formulário específico de declaração de hipossuficiência.

Na prática:

  • o migrante pode assinar declaração de hipossuficiência econômica;
  • a PF analisa a situação, podendo isentar ou reduzir a multa;
  • decisões da Justiça Federal e dos Tribunais Regionais Federais têm reconhecido esse direito, especialmente para pessoas vulneráveis.

7.5. Situações especiais (refúgio, apatridia, filhos brasileiros, casamento etc.)

Além disso, casos como:

  • solicitantes de refúgio;
  • apátridas;
  • pessoas com filhos brasileiros;
  • cônjuges de brasileiros;

merecem análise ainda mais cuidadosa, pois há proteções adicionais em tratados internacionais, na Constituição Federal e na própria Lei de Migração. Nesses contextos, decisões precipitadas, como sair do país sem orientação, podem prejudicar direitos importantes.


8. Como se prevenir: passos práticos antes e durante a estada no Brasil

A melhor solução ainda é não chegar à situação de irregularidade. Algumas atitudes simples ajudam muito:

  1. Verificar o regime de vistos antes de viajar
    Consulte o “Quadro Geral de Regime de Vistos” do Itamaraty para saber se seu país precisa de visto, qual o tipo e por quanto tempo é permitida a estada.
  2. Guardar todos os comprovantes de entrada e saída
    Tenha cópia dos carimbos do passaporte, cartões de embarque e reservas. Em caso de dúvida, esses documentos ajudam a demonstrar o período real de permanência.
  3. Controlar o prazo de estada com atenção
    • Para visitantes, considere a regra dos 90 + 90 dias (até 180 dias em um ano migratório, quando houver reciprocidade).
    • Para residentes, confira a validade do RNM (Registro Nacional Migratório) e da autorização de residência.
  4. Buscar prorrogação ou mudança de status antes do prazo vencer
    O próprio governo orienta a procurar a Polícia Federal antes do término do prazo de estada, especialmente em casos de turista que precisa prolongar a permanência.
  5. Avaliar se há base para residência (trabalho, estudo, família, nômade digital etc.)
    Em muitos casos, insistir em “ficar como turista” é mais arriscado do que buscar um fundamento sólido de residência.
  6. Guardar comprovantes de renda e de vínculos
    Isso facilita tanto a eventual regularização quanto pedidos de isenção de taxas e multas por hipossuficiência, se necessário.

9. Quando procurar um advogado especialista?

Embora existam cartilhas da Defensoria Pública da União e de organismos internacionais com orientações importantes, cada caso tem suas particularidades.

É altamente recomendável buscar um advogado com experiência em Direito Internacional e Migratório quando:

  • já houve autuação por excesso de estadia;
  • a PF notificou sobre deportação ou instaurou processo administrativo;
  • há interesse em permanecer no Brasil com base em reunião familiar, trabalho, estudo ou acolhida humanitária;
  • a pessoa não tem condições de pagar a multa e precisa pleitear isenção ou redução;
  • existe histórico de deportação anterior e desejo de retornar ao país.

O profissional poderá analisar:

  • se há fundamento para anular ou reduzir a multa;
  • se o processo de deportação tem vícios;
  • se existe caminho jurídico para regularizar a situação e proteger a vida familiar, profissional e acadêmica do migrante.

10. Conclusão: informação e planejamento são a melhor defesa

Em resumo, excesso de estadia no Brasil não significa o fim da linha:

  • a irregularidade gera multa;
  • pode, em determinadas situações, levar a processo de deportação;
  • porém, há espaço para regularização, defesa, isenção e planejamento.

Ao conhecer:

  • a base legal (Lei nº 13.445/2017 e Decreto nº 9.199/2017);
  • os prazos;
  • as possibilidades de residência e de isenção de multas;

o migrante deixa de ser refém do medo e passa a agir com consciência e estratégia.

Se você ou alguém conhecido está enfrentando esse problema, não tome decisões sozinho. Cada passo – sair do país, pagar ou discutir a multa, pedir residência – deve ser pensado com apoio técnico. Assim, é possível reduzir riscos hoje e manter abertas as portas para o futuro no Brasil.